Muitos confundem essas duas etapas essenciais para a editoração de um livro. E eu já começo respondendo à pergunta que mais me fazem: o seu livro precisa de preparação ou de revisão? Dos dois. E, sim, eu não preciso avaliar o seu original para saber que ele precisa das duas etapas, pois todos os originais precisam, inclusive os escritos por escritores best-sellers.
De uma forma simples: a preparação melhora o seu texto, e a revisão, corrige.
Os próprios termos já esclarecem: a preparação vai preparar o seu original para a publicação, para o público, e a revisão vai revisar o trabalho realizado na preparação para efetuar as correções não feitas na etapa anterior.
Enquanto o revisor foca nos erros — principalmente gramática e ortografia, mas também qualquer erro, como de coesão e coerência, e também os erros gráficos de diagramação —, o preparador foca em todo o resto que envolva a qualidade da produção textual.
Sendo assim, o nível de intervenção na preparação é muito maior, e por isso a edição é realizada em arquivo .doc, pois o word oferece ferramentas para edições robustas, além de marcar cada uma delas para que o escritor possa avaliá-las.
O nível de intervenção realizado na preparação vai depender da qualidade do original. Originais com muitos problemas carecem de um nível de intervenção alto, enquanto originais com poucos problemas carecem de um nível de intervenção baixo.
Muito depende também das particularidades da obra, se há uma proposta diferenciada, mas, no geral, na preparação de texto o profissional se atenta principalmente a:
Coesão: as palavras e frases precisam fazer sentido entre si, e a coesão garante essa ligação correta, harmônica entre as partes de um texto.
Coerência: as informações precisam fazer sentido com o que conhecemos de mundo, e a coerência garante que haja ligação lógica entre as ideias contidas num texto.
Fluidez: salvo exceções, o ideal é que a leitura de um texto flua sem engasgos, sem que o leitor precise fazer pausas, precise reler trechos para conseguir fazer a correta interpretação. Normalmente, quando a coerência e a coesão estão corretas, o texto é claro, fluido, mas muitas vezes é preciso ir além: uma frase de dez linhas pode estar correta, mas pode dificultar a leitura, quebrar a fluidez.
Repetições e vícios de linguagem: todo escritor deixa passar repetições em seu texto e tem seus próprios vícios de linguagem. É o preparador que vai eliminá-los, seja de modo simples, substituindo determinadas palavras por sinônimos, ou de modo mais complexo, reformulando frases.
Adaptação da linguagem ao público-alvo e ao conteúdo proposto: cada livro tem sua proposta e, consequentemente, seu público-alvo. Um infantojuvenil, por exemplo, exige construção de frases mais simples, linguagem informal, desapego à gramatica normativa, entre outros. A linguagem abordada – e aqui estamos falando também de erros gramaticais propositais – precisa estar adaptada ao conteúdo e ao público-alvo.
Padronização: cada editora tem a sua padronização de estilo; por exemplo: os números são grafados em numeral ou em extenso? Quais termos são grafados em caixa-alta?
Ufa! É muita coisa pra prestar atenção durante a preparação de texto, não é? E tem mais: o preparador ainda precisa se atentar a erros gramaticas e ortográficos. É possível fazer tudo isso? Não. É inevitável que o preparador deixe erros passar. E, como o foco dele são alterações robustas, que muitas vezes exigem reformulação de frases, os erros simples — gramática e ortografia — é no que ele menos presta atenção.
É por isso que existe a etapa de revisão, para que um profissional edite novamente o texto preparado em busca dos erros que o preparador deixou passar. Normalmente, o texto preparado é diagramado, de modo que o revisor revise a diagramação, e por isso faz parte do seu trabalho também se atentar a erros de projeto gráfico: formatação, alinhamento, espaçamento, linhas órfãs, viúvas, entre outros.
Ou seja, o revisor, como o termo sugere, revisa o que já foi feito: no que o preparador e o diagramador erraram?
Quando um texto foi bem preparado, os erros que sobram para o revisor são, no geral, de gramática e ortografia. As decisões robustas, que envolvem a abordagem do texto, a linguagem, o tom, o ritmo, já foram tomadas na preparação, e cabe ao revisor respeitá-las, focando unicamente em erros, inclusive os de padronização.
Eventualmente, porém, o revisor poderá ter de lidar com correções que exigem alterações robustas, como os de coerência e coesão, e até os de conteúdo.
Alguns erros gramaticais também podem ser um inconveniente para o revisor, pois exigem alterações maiores. Veja, por exemplo, o erro de tempo verbal: se o preparador não tiver se atentado ao pretérito mais-que-perfeito, por exemplo, essa correção pode arruinar a linguagem do livro — imagine várias páginas com conjugações como “fizera”, “falara”, “beijara” —, ou, para que isso não ocorra, pode demandar uma mudança de estrutura, transformando alguns trechos em flashbacks.
Isso é um problemão para a editoração, pois um texto diagramado não deve sofrer muitas alterações, não só para não gerar retrabalho, mas também para diminuir a chance de erro.
Ficou claro que o preparador precisa, sim, se atentar à gramatica e ortografia durante a preparação, né? Ele não pode se apoiar no fato de que é inevitável deixar erros passar para realizar um trabalho sem estratégia. O preparador de textos precisa saber quais falhas são convenientes deixar para o revisor, e quais não. Até por uma questão de quantidade: uma coisa é deixar alguns erros passar, e outra coisa é deixar milhares.
Vale ressaltar que o tema aqui abordado é complexo e vai muito além dos exemplos trazidos. O trabalho com o texto não é nada fácil; não é à toa que é dividido entre várias etapas, realizadas por profissionais diferentes. Como estou me comunicando em maioria com escritores, que não têm um know-how completo sobre produção textual, resumi bastante e optei por exemplos que facilitem o entendimento.
Mas, me diga, deu pra entender a diferença entre preparação e revisão? Espero que sim.
Até a próxima!
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